quarta-feira, 17 de junho de 2015

Budismo

Texto extraído do livro: 

O LIVRO DAS RELIGIÕES


A VIDA DO BUDA

O fundador do budismo foi o filho de um rajá, Sidarta Gautama (560-480 a.C.), que viveu no Nordeste da Índia. Sobre sua vida há várias histórias, mais ou menos lendárias, mas os pontos de maior destaque são os seguintes:

O PRÍNCIPE SIDARTA

O príncipe Sidarta cresceu no seio da fortuna e do luxo. O rajá ouvira uma profecia de que seu filho ou se tornaria um poderoso governante ou tomaria o caminho oposto e abandonaria o mundo por completo. Esta última opção aconteceria se lhe fosse permitido testemunhai as carências e o sofrimento do mundo. Para evitar que isso ocorresse, o rajá tentou proteger o filho contra o mundo que ficava além das muralhas do palácio, ao mesmo tempo que o cercava de delícias e diversões. Ainda jovem, Sidarta se casou com sua prima e mantinha também um harém de lindas dançarinas.

A VIRADA

Aos 29 anos Sidarta experimentou algo que haveria de ser o ponto crucial de sua vida. Apesar da proibição do pai, ele se arriscou a sair do palácio e viu, pela primeira vez, um velho, um homem doente e um cadáver em decomposição. Entretanto, depois dessas impressões desanimadoras, avistou um asceta com a expressão radiante de alegria. Percebeu então que uma vida de riqueza e prazer é uma existência vazia e sem sentido. E se perguntou: haverá alguma coisa que transcenda a velhice, a doença e a morte? Sidarta também se sentiu tomado por uma grande compaixão pela humanidade e um chamado para livrá-la do sofrimento. Imerso em pensamentos, voltou ao palácio e na mesma noite renunciou à sua agradável vida de príncipe. Sem se despedir, abandonou esposa e filho, e partiu para uma vida de andarilho.

A ILUMINAÇÃO

As narrativas relatam que Sidarta, depois de uma vida de abundância, passou para o extremo oposto: os exercícios ascéticos.

Obrigou-se a comer cada vez menos, até que finalmente, segundo a lenda, conseguia sobreviver com um único grão de arroz por dia.

Dessa maneira ele esperava dominar o sofrimento; mas nem os exercícios de ascetismo nem a ioga lhe deram o que procurava.

Assim, ele adotou o "caminho do meio", buscando a salvação por meio da meditação. E, aos 35 anos, após seis anos de vida ascética, alcançou a iluminação (bodhi), enquanto estava sentado em meditação sob uma figueira, à margem de um afluente do rio Ganges. Sidarta agora se transformara num buda, ou seja, um "iluminado": alcançou a percepção de que todo o sofrimento do mundo é causado pelo desejo. É apenas suprimindo o desejo que podemos escapar de outras encarnações.

Durante sete dias e sete noites o Buda ficou sentado debaixo de sua árvore da iluminação. Ganhou dessa forma a compreensão de uma realidade que não é transitória, uma realidade absoluta acima do tempo e do espaço. No budismo isso se chama nirvana. Ao dominar seu desejo de viver, que antes o atava à existência, o Buda parou de produzir carma e, portanto, não estava mais sujeito à lei do renascimento. Conseguira alcançar a salvação para si mesmo, e o caminho estava aberto pata abandonar o mundo e entrar no nirvana final. O deus Brahma, porém, instou com ele para que difundisse seus ensinamentos. E então, mais uma vez, o Buda sentiu compaixão pelos outros seres humanos e por todos os seres vivos. Ele "contemplou o mundo com um olhar de Buda" e decidiu "abrir o portão da eternidade" para aqueles que o quisessem ouvir. O Buda decidira se tornar um guia dos seres humanos.

BUDA E SEUS DISCÍPULOS

Buda seguiu então para Benares, que já naquela época era um centro religioso. Ali deu sua primeira palestra — o famoso sermão de Benares, que contém os elementos mais importantes de seus ensinamentos. As "rodas da instrução" tinham sido postas em movimento.

Diversos monges mendigos seguiam Buda, e durante mais de quarenta anos ele e seus discípulos vagaram pela região nordeste da Índia.

Desde o início os seguidores de Buda se dividiram em dois grupos, os leigos e os monges, cada um com seus próprios deveres. Quando Buda tinha por volta de oitenta anos, de repente adoeceu e decidiu se despedir dos discípulos. Antes de morrer, voltou-se para o triste rebanho dos discípulos a seu redor e disse:

"Talvez alguns de vós estejam pensando: 'As palavras do mestre pertencem ao passado, não temos mais mestre'. Mas não é assim que deveis ver as coisas. O darma (instrução) que vos dei deve ser o vosso mestre depois que eu partir".

Os ensinamentos de Buda

A LEI DO CARMA

O budismo cresceu dentro do hinduísmo como um caminho individual para a salvação. As duas religiões têm muitos conceitos em comum: as doutrinas do renascimento, do carma e da salvação.

Para Buda, um ponto de partida óbvio é que o ser humano é escravizado por uma série de renascimentos. Como todas as ações têm conseqüências, o princípio propulsor por trás do ciclo nascimento-morte-renascimento são os pensamentos do homem, suas palavras e seus atos (carma).

Também nós podemos passar pela experiência de ver que certas coisas que pensamos ou fizemos em determinada época da vida nos afetaram mais tarde. Podemos sentir que nosso passado nos alcançou. É essa mesma idéia que percorre o hinduísmo e o budismo. A diferença é que os orientais vêem essa relação como algo estritamente regulado — e que se estende de uma vida a outra. O tipo de vida em que o indivíduo vai renascer depende de suas ações em vidas anteriores. O homem colhe aquilo que plantou. Não existe "destino cego" nem "divina providência". O resultado flui automaticamente das ações. Portanto, é tão impossível fugir de seu carma quanto escapar de sua própria sombra. Enquanto o ser humano tiver um carma, ele está fadado a renascer.

Embora se possa dizer que a lei do carma possui um certo grau de justiça, ela é vista, no hinduísmo e no budismo, como algo um tanto negativo, algo de que se deve escapar. Assim, a salvação consiste em ser libertado do círculo vicioso dos renascimentos. A eterna série de reencarnações costuma ser comparada a um rio que separa o homem do nirvana. O objetivo do budismo, comum com os outros caminhos indianos para a salvação, é encontrar a "passagem" por onde se pode atravessar para a outra margem.

VISÃO DA HUMANIDADE

Num aspecto importante, porém, os ensinamentos de Buda são diferentes do consenso indiano em geral. O hinduísmo acredita que o homem tem uma alma individual eterna (atmã), a qual sobrevive de uma existência para outra. Assim como uma pessoa descarta suas roupas velhas e gastas, a alma vai se revestindo de outros corpos, sempre renovados. É a alma do homem — seu eu mais íntimo — que está acorrentada à reencarnação. A alma do homem também é considerada idêntica, total ou parcialmente, ao espírito universal (Brahman).

Buda rompe radicalmente com essa doutrina ao negar que o ser humano tenha alma e ao rejeitar a existência de um espírito universal. De acordo com o budismo, a alma é tão fugaz como tudo o mais neste mundo. O fato de um homem achar que é um "eu", ou uma alma, baseia-se na ignorância, e essa ignorância tem conseqüências graves, uma vez que promove o desejo, e é o desejo que cria o carma do indivíduo.

O budismo vê a vida humana como uma série ininterrupta de processos mentais e físicos que alteram o homem de momento a momento. O bebê não é a mesma pessoa que o adulto, e o adulto não é a mesma pessoa que era ontem. E como as imagens numa tela de cinema: movem-se muito depressa e não conseguimos perceber que o filme é "artificial", que não é algo "vivo". Na realidade, o filme é a soma das imagens individuais — ou de uma série de instantes.

"De nada mais posso dizer: 'Isto é meu'", ensinava Buda, "e de nada posso dizer: 'Isto sou eu.'" Ambas as coisas são ilusões. Não há um núcleo imutável da personalidade, não existe um "eu", um ego. Tudo é constituído de fatores existenciais impessoais que formam combinações fadadas a decair. Tudo é transitório.

AS QUATRO NOBRES VERDADES SOBRE O SOFRIMENTO

Depois de experimentar sua iluminação debaixo da figueira, Buda fez o sermão de Benares, em que apresentou as quatro nobres verdades sobre o sofrimento. Elas demonstram que tudo é sofrimento; que a causa do sofrimento é o desejo; que o sofrimento cessa quando o desejo cessa; e que isso se consegue seguindo o caminho das oito vias. Em outras palavras: Buda faz primeiro um diagnóstico, mostrando que a condição do homem é de doença (primeira nobre verdade). Ele então indica a causa da doença (segunda nobre verdade). Afirma, no entanto, que a doença é curável (terceira nobre verdade), e por fim dá uma descrição detalhada de como a doença deve ser tratada, receitando uma cura de oito pontos (quarta nobre verdade). Assim, Buda assume o papel de médico; é por isso que os textos budistas o chamam de "o grande médico".

A primeira nobre verdade determina que tudo no mundo é sofrimento. "Nascer é sofrer, envelhecer é sofrer, morrer é sofrer, estar unido com aquilo de que não gostamos é sofrer, separarmo-nos daquilo que amamos é sofrer, não conseguir o que queremos é sofrer." Em termos budistas o sofrimento implica algo mais do que mero desconforto físico e psicológico.

Pode-se dizer que a existência como um todo é manchada pelo sofrimento, pois tudo é passageiro. A pessoa que não consegue perceber que o mundo, do ponto de vista do ser humano, é inadequado, é uma pessoa cega. Mas isso não significa que o budismo negue toda felicidade material e mental. Ele reconhece que existe alegria tanto na família como no mosteiro. Todavia, tudo aquilo que amamos e a que nos apegamos simplesmente não vai durar.

Na segunda nobre verdade, Buda afirma que o sofrimento é causado pelo desejo do ser humano. O desejo implica sobretudo desejar com os sentidos, a sede de prazeres físicos.
Como essa ânsia nunca pode ser plenamente saciada, ela sempre irá acarretar um sentimento de desprazer. Até mesmo o desejo de sobrevivência do ser humano contribui para manter o sofrimento. Enquanto ele se apegar à vida — e continuar acreditando que tem uma alma —, irá perceber o mundo como sofrimento. O budismo também rejeita o extremo oposto. O desejo de anulação — ou desejo de morrer — igualmente amarra o ser humano à existência. Em primeiro lugar, um tal desejo pressupõe que o ser humano tem uma alma que pode ser eliminada; em segundo, não leva em consideração o carma, que impõe o renascimento. Tirar a própria vida não resolve nada no budismo. Isso não irá libertar a pessoa do eterno ciclo.

A terceira nobre verdade é que o sofrimento pode ser levado ao fim. Isso acontece quando o desejo cessa. E quando o desejo cessa, começa o nirvana. Um pré-requisito necessário para suprimir o desejo é que a ignorância do homem deve ser enfrentada, pois ela é a causadora do desejo. Assim, só o homem que não enxerga sente desejo. A ignorância leva ao desejo, o desejo leva à atividade, a atividade traz consigo o renascimento, e o renascimento origina mais ignorância. Aqui se descreve um círculo vicioso, e para que este círculo vicioso — ou "corrente da causalidade" — seja rompido, o homem deve atacar a raiz do problema: sua própria ignorância.

A quarta nobre verdade afirma que o homem pode ser libertado do sofrimento — e do renascimento — seguindo o caminho das oito vias.

O caminho das oito vias

Com base em sua própria experiência, Buda acreditava que o homem deve evitar os extremos da vida. Não se deve viver nem no prazer extravagante, nem na autonegação exagerada. Ambos os extremos acorrentam o homem ao mundo e, assim, à "roda da vida".
O caminho para dar fim ao sofrimento é o "caminho do meio", e Buda o descreveu em oito partes: (1) perfeita compreensão; (2) perfeita aspiração; (3) perfeita fala; (4) perfeita conduta; (5) perfeito meio de subsistência; (6) perfeito esforço; ( 7) perfeita atenção, e (8) perfeita contemplação.

Perfeita compreensão e perfeita aspiração. É a ignorância do homem que põe a roda da vida em movimento. Portanto, o homem deve construir sua compreensão sobre como o mundo funciona. Isso significa, entre outras coisas, compreender as verdades acerca do sofrimento e o ensinamento de Buda de que o homem não tem alma.

Em seguida, o homem deve se dedicar a lutar contra o desejo, que é a raiz do sofrimento. Deve também evitar o ódio e a luxúria, ambos causados pela crença equivocada num "eu" distinto e separado do ambiente em torno. Por último, o homem deve olhar para o Buda como um ideal.

Perfeita fala, perfeita conduta, perfeito meio de subsistência. Esses pontos estabelecem a ética do budismo, seu código moral. Perfeita fala significa que o homem deve se abster de contar mentiras, fazer intrigas e ter conversas vazias, e que deve falar com seus semelhantes de um modo verdadeiro, amigável e carinhoso. Para o budista, ficar em silêncio também está incluído na fala perfeita.

Perfeita conduta significa seguir os cinco mandamentos que se aplicam a todos os budistas: não matar nenhum ser vivo, não roubar, não ser sexualmente promíscuo, não mentir e não tomar estimulantes. Mais tarde, foram acrescentados outros mandamentos enunciados na forma positiva. Diversos textos budistas ressaltam a utilidade de dar presentes e realizar serviços para os outros. Estudar a doutrina e disseminá-la também faz parte da perfeita conduta. Um aspecto do perfeito meio de subsistência é que se deve escolher um trabalho que não contrarie os cinco mandamentos. Por exemplo, um açougueiro, um comerciante de vinhos, um fabricante de armas ou um soldado profissional teriam de encontrar uma profissão alternativa se quisessem permanecer budistas.

Perfeito esforço, perfeita atenção e perfeita contemplação. Esses três pontos finais se relacionam com a maneira como o ser humano pode melhorar a si mesmo e purificar sua mente. Perfeito esforço significa que o budista não deve deixar que pensamentos ou estados de espírito destrutivos intervenham; e se já estão presentes, deve tentar expulsá-los antes que tenham efeitos palpáveis.  Perfeita atenção é um precursor do último item. A autocontemplação é o meio pelo qual o budista alcança pleno controle sobre o corpo e a mente. Uma vez conseguido isso, ele está pronto para iniciar a meditação propriamente dita.

O budismo tem uma doutrina abrangente sobre os vários níveis e estágios da meditação. Durante a meditação, todos os músculos se relaxam, possivelmente também pelo fato de o praticante sentar numa posição especial de ioga. Toda a concentração deve focalizar uma só coisa. Esta pode ser um objeto, uma palavra ou a própria respiração. A psicologia budista hoje ensina que a mente humana se compõe de duas partes: uma superficial, que é excitada pelos sentidos, e as profundezas da mente, que são tranqüilas e imóveis. O objetivo da meditação é acalmar a superfície perturbada. Quando isso acontece, o budista perde todo sentido do tempo e do espaço, e todas as ilusões sobre "eu" e "meu" desaparecem. É nesse ponto que ele pode ter esperança de alcançar a plena iluminação (bodhi), na qual atinge uma compreensão perfeita das "quatro nobres verdades", deixando de enganar a si mesmo sobre a existência e se libertando da lei do carma. O budista agora se tornou um arhat (isto é, "venerável"), o que  significa que não irá mais renascer. E quando morrer, atingirá o eterno nirvana.

Nirvana

Qual foi a verdade que Buda alcançou debaixo de sua figueira? Suas idéias fundamentais eram profundamente pessimistas, como já vimos. Tudo o que existe no mundo é (a) sem autonomia, (b) transitório, e, em conseqüência, (c) pleno de sofrimento. Assim, ele não via esperança enquanto o homem estivesse preso nesse ciclo.
Contudo, existe algo eterno, algo fora do sofrimento. O budista chama a isso de nirvana. Essa palavra significa, na verdade, "apagar", uma referência ao fato de que o desejo "se extingue" quando se atinge o nirvana. A imagem representa o desejo como uma chama que se apaga quando o combustível termina— o combustível é a luxúria humana, o ódio e a ilusão.

As descrições do nirvana em textos budistas costumam ser expressas em termos negativos. Uma vez que o nirvana é o oposto direto do ciclo do renascimento, uma vez que ele não pode ser comparado a nada em nossa vida diária, só é possível dizer o que o nirvana não é. Poderíamos talvez descrever o nirvana como uma quinta dimensão, divorciada de nossa existência quadridimensional.

Poucos textos budistas, porém, descrevem o nirvana em termos positivos.
Uma condição para alcançar o nirvana é que o budista encontre a iluminação (bodhi), exatamente como ocorreu com o Buda debaixo de sua figueira. Logo, as boas obras por si sós não bastam para o nirvana. Entretanto, um estilo de vida irreprochável pode levar a bons renascimentos, que mais tarde poderão possibilitar o encontro da iluminação. Buda, segundo se conta, nasceu 547 vezes antes de finalmente chegar lá.

Um estado em que todo o carma já foi esgotado e a lei do renascimento foi rompida — é isso que o nirvana descreve. Assim, o nirvana é uma condição que se pode experimentar aqui e agora. Pode ser tão intensa que o budista sente que ela está queimando o mundo inteiro. E quando ele enfim volta para o mundo, tudo o que encontra são cinzas frias.
O nirvana final, que a pessoa atinge quando morre, é irreversível. Por vezes ele é designado no budismo por um termo especial, parinir-vana,  isto é, "extinção absoluta", ou "extinção última".

Ética

Quando o Buda alcançou a iluminação depois de sua meditação, o deus Brahma foi até ele e lhe pediu que levasse seus ensinamentos para outras pessoas. E mais uma vez Buda sentiu compaixão pelos seres humanos e por todos os outros seres vivos.
"Contemplou o mundo com olhar de Buda" e decidiu "abrir o portão da eternidade" para os que quisessem ouvir. Buda decidiu se tornar guia do ser humano.

Essa atitude serve de exemplo para outros budistas, pois a vida de Buda é um ideal que os exorta a se comportar eticamente. A compaixão e o amor são centrais na ética budista. Não só as ações, mas também os sentimentos e afetos são importantes. A caridade que fazemos não apenas afeta os outros, mas contribui para enobrecer nosso próprio caráter.

Os cinco mandamentos

Para a vida diária o budismo tem cinco regras de conduta:

1. Não fazer mal a nenhuma criatura viva.
2. Não tomar aquilo que não lhe foi dado (não roubar).
3. Não se comportar de modo irresponsável nos prazeres sensuais.
4. Não falar falsidades.
5. Não se entorpecer com álcool ou drogas.

Essas regras de conduta costumam ser chamadas de cinco mandamentos, porém o budismo não reconhece nenhum ser superior capaz de dar ordens à humanidade sobre como viver. Assim, as regras não dizem "farás isso" ou "não farás aquilo". Elas são formuladas da seguinte maneira: "Tentarei ensinar a mim mesmo a não fazer mal a nenhuma criatura viva".

1. NÃO FAZER MAL A NENHUMA CRIATURA VIVA.

Esta é considerada a mais importante das cinco virtudes. Nem um outro ser humano nem os animais devem ser prejudicados. O ser humano é o mais importante, já que é superior aos animais. Os budistas consideram o pacifismo um ideal, embora nem todos os budistas sejam pacifistas. Também os países budistas já travaram guerras, e muitas pessoas acreditam que essa regra pode ser quebrada quando se trata de autodefesa. Entretanto, um texto budista afirma que o soldado profissional que morrer em batalha renascerá no inferno ou então como animal.

Para o budista, a vida começa na concepção; desse modo, o aborto infringe essa primeira regra. Só que os métodos anticoncepcionais normalmente são permitidos.
O suicídio também é uma violação da regra, mas não se a pessoa sacrificou sua vida por outra vida. Durante a Guerra do Vietnã, vários monges budistas atearam fogo às próprias vestes para despertar a consciência internacional.

Não há um vegetarianismo coerente no budismo, ainda que muitos monges excluam a carne de sua dieta. Supõe-se que Buda também concordou que se comesse carne, desde que a pessoa estivesse certa de que o animal não fora morto especialmente para ela. Matar uma mosca com um tapa é pior. Como vemos, o motivo e a intenção são relevantes.

2.  NÃO TOMAR AQUILO QUE NÃO LHE FOI DADO.

Isso não se refere simplesmente ao roubo, mas também à trapaça de todos os tipos. Podemos considerar que é uma regra acerca da correção nos negócios e da ética no trabalho.

3. NÃO SE COMPORTAR DE MODO IRRESPONSÁVEL NOS PRAZERES SENSUAIS.

Essa regra se refere às atividades sexuais que podem prejudicar os outros: estupro, incesto e adultério. A atitude para com o adultério varia segundo os costumes locais. O budismo não abrange apenas sociedades monogâmicas,  mas também culturas cuja tradição engloba a poligamia e a poliandria. Já o homossexualismo é sempre considerado uma quebra dessa regra.

Essas três primeiras regras se relacionam às atividades humanas e se incluem no item "perfeita conduta"do caminho das oito vias. O item "perfeita fala" abrange a próxima regra.

4. NÃO FALAR FALSIDADES.

A verdade é extremamente importante no budismo, mas essa regra não trata apenas da mentira. Ela também alerta contra as respostas maldosas, a fofoca, a ira e as conversas fúteis. O homem deve falar com seus semelhantes de modo verdadeiro, amigável e devotado. Até mesmo ficar em silêncio faz parte da perfeita fala.

5. NÃO SE ENTORPECER COM ÁLCOOL OU DROGAS.

Ficar entorpecido ou embriagado implica não poder se concentrar nas regras que devem ser seguidas. O budismo não é tão rigoroso contra o álcool quanto o islã.

Outras regras mais estritas

Em certos períodos, alguns leigos se submetem a uma disciplina mais estrita. Alguns vão mais longe, seguindo as mesmas regras que se aplicam aos monges e monjas noviços. Nesse caso, as cinco regras passam a incluir, por exemplo, a abstinência sexual (celibato)

Além disso, há outras cinco regras:

* Não comer em horas proibidas (por exemplo, após o meio-dia).
* Afastar-se de todos os divertimentos mundanos.
* Abdicar de todos os luxos (como jóias, perfumes etc).
* Não dormir numa cama macia nem larga.
* Não aceitar nem possuir ouro, prata ou dinheiro.

O PERFEITO MEIO DE SUBSISTÊNCIA

O quinto estágio do caminho das oito vias é o perfeito meio de subsistência. Significa, entre outras coisas, que se deve escolher um meio de vida que não obrigue à infração das cinco regras de conduta.

Embora um budista possa comer carne, não deve ser açougueiro.

Embora possa tomar um copo de vinho, não deve ser comerciante de vinhos. Embora sirva ao exército de seu país, não deve ser um negociante de armas.

A melhor de todas as vidas é a do monge, pois ele pode se devotar inteiramente ao caminho das oito vias.

O VALOR DA DOAÇÃO

As cinco regras de conduta estão expressas na forma negativa, mas quando são seguidas, seus aspectos positivos aparecem. O oposto de fazer mal é demonstrar amor e compaixão. O oposto de roubar é dar. Uma das coisas mais positivas que um budista pode fazer é dar presentes. Isso significa sobretudo fazer doações para as sociedades monásticas, que dependem totalmente da caridade dos leigos. Tais presentes elevam o carma da pessoa. Mas dar com a intenção de obter algo em troca não basta. Quanto mais puro o motivo para dar, melhor carma trará.

Buda exortava os que desejavam lhe querer bem a querer bem aos doentes. Muitos mosteiros se empenham em trabalhos humanitários. Os budistas se preocupam especialmente em cuidar dos moribundos. A morte é um momento decisivo em relação ao nascimento; portanto, o objetivo é ter uma boa morte.

A COABITAÇÃO E O PAPEL DAS MULHERES

O casamento não é sagrado para os budistas, mas apenas um tipo de acordo entre as partes. Por esse motivo os monges não celebram casamentos. No Japão, quando os budistas se casam, procuram um sacerdote xintoísta. O divórcio, embora ainda pouco comum na maioria das culturas budistas, também não é uma questão religiosa.

O marido deve mostrar respeito para com sua mulher, e esta, por sua vez, deve cumprir seus deveres domésticos. Apesar de várias mulheres em países budistas desfrutarem de uma posição elevada, normalmente se considera menos vantajoso renascer como mulher do que como homem.

A vida religiosa

MONGES, MONJAS E LEIGOS

Buda criou uma nova ordem, a sociedade monástica, independente do sistema de castas. Para seguir à risca os ensinamentos do Buda, era necessário deixar para trás todos os cuidados e as preocupações relativas à família e à vida social. Até hoje a ordem monástica constitui a espinha dorsal da vida religiosa na maioria das terras budistas.

Dessa maneira, ao considerara vida religiosa budista, é importante distinguir entre os monges e as monjas, por um lado, e, por outro, os leigos. Monges e monjas têm regras de conduta muito mais estritas do que os leigos. Em primeiro lugar, há as dez regras, que também se aplicam aos noviços; além disso, há várias centenas de outros mandamentos e in-junções que definem tais regras com mais precisão.

Como já vimos, os monges e as monjas levam uma vida de simplicidade e pobreza. Desde os dias do Buda, costumam obter o pouco de que necessitam para sobreviver pedindo esmolas, o que não é tido, de modo nenhum, como degradante. Pelo contrário: para o leigo, é uma honra dar esmolas aos monges. Em alguns lugares os monges esmolam nas ruas, de porta em porta. Monges vestidos com seu hábito cor de açafrão pedindo comida (em geral arroz) pelas ruas é uma cena comum nos países budistas do Sudeste asiático. Em outras regiões, a tarefa de esmolar adquire uma forma mais organizada; por exemplo, cada casa de família é responsável pela comida do mosteiro em certos dias da semana.

Um mosteiro budista não fica isolado da vida da cidade ou da aldeia. Não são apenas os leigos que têm deveres para com os monges; estes também têm suas responsabilidades para com os leigos. Em determinados dias, instruem os leigos sobre os ensinamentos do Buda. As pessoas comuns podem ainda passar temporadas em retiro num mosteiro, a fim de meditar ou receber instrução especial. Isso costuma acontecer na época das monções. Em países devotamente budistas, como Birmânia e Tailândia, é comum todos os meninos permanecerem algum tempo num mosteiro, aprendendo budismo.

Assim, podemos dizer que os dois grupos — monges e leigos — são interdependentes. Mesmo que um budista não venha a se tornar um monge em sua vida atual, se ele ajudar a sustentar um mosteiro, pode aspirar a ser um monge na próxima encarnação.

O CULTO

Em tempos antigos o culto religioso consistia inteiramente em venerar as relíquias do Buda ou de outros homens santos. Originalmente as relíquias eram guardadas em pequenos montes de terra (stupas). Aos poucos estas se transformaram naquelas construções características, em forma de sino ou de domo, que hoje chamamos de pagodes.

A partir do século I a.C., tornou-se comum produzir imagens e estátuas do Buda. Elas podem ser vistas por toda parte nos países budistas, tanto nos templos como nos lares.
E seja onde for, o budista devoto fará sua confissão — a fórmula tripla do refúgio, também chamada "As Três Jóias":

* Procuro refúgio no Buda.
* Procuro refúgio nos ensinamentos.
* Procuro refúgio na comunidade monástica.

Apesar de os budistas venerarem as imagens do Buda queimando incenso e pondo florese outras oferendas diante delas, para o budista ortodoxo isso não é propriamente uma adoração formal. Buda foi apenas o guia da humanidade, foi o mestre "glorificado", e como já entrou no nirvana, não pode ver nem recompensar as ações de um budista. Por isso, suas imagens não devem ser adoradas; estão ali para lembrar os ensinamentos do Buda e auxiliar o budista em sua meditação e em sua vida religiosa.

FERIADOS RELIGIOSOS

A festa religiosa mais importante para os budistas é o aniversário do nascimento do Buda, comemorado em abril ou maio, na lua cheia. Também se acredita que foi esse o dia da iluminação do Buda e de sua entrada no nirvana. Além dessa data, cada país tem várias festas religiosas, muitas vezes celebradas com peregrinações em massa aos mosteiros ou pagodes mais conhecidos. Para a maioria dos leigos, as festas e outras manifestações devocionais externas desempenham um papel bem mais relevante do que a meditação praticada pelos monges.

DEUSES

Buda não negou a existência dos deuses. Como já vimos, foi um deus que o exortou a proclamar sua mensagem para a humanidade. Ele não era um ateu no sentido ocidental. Todavia, acreditava que a existência dos deuses era transitória, assim como a existência humana. Embora eles vivam mais tempo que os seres humanos, em última análise também estão atrelados ao ciclo do renascimento. Ainda não alcançaram a "outra margem" e, portanto, não podem redimir o homem de tal ciclo. Por isso, o papel dos deuses é insignificante na literatura monástica budista.

Não obstante, nos países budistas há uma adoração generalizada de demônios, espíritos e várias outras divindades.

Diferentemente do próprio Buda, todos estes são seres vivos e ativos, os quais — se cultuados de modo correto — podem trazer vantagens mundanas. Os templos budistas muitas vezes contêm estátuas de deuses como Vishnu, Indra  e Ganesha,  mas sempre dispostas de maneira subserviente a Buda.

O budismo tem espaço para um amplo espectro de cultos e sentimentos religiosos. Essa é uma importante razão pela qual o budismo ganhou tão ampla aceitação em toda a Ásia.

A difusão do budismo

Não muito depois da morte do Buda ocorreu uma divergência entre seus discípulos acerca da maneira como os ensinamentos dele deviam ser interpretados. Um século mais tarde (por volta de 380 a.C.) foi realizado um concilio. Como diversos monges expressaram o desejo de moderar a disciplina monástica, o encontro terminou numa divisão entre uma facção conservadora e outra mais liberal.
Na época moderna é costume distinguir entre duas tendências principais:  Theravada  ("a escola dos antigos"), predominante no Sul da Ásia (Birmânia, Tailândia, Sri Lanka, Laos e Camboja), e Mahayana ("o grande veículo"), predominante no Norte da Ásia (China, Japão, Mongólia, Tibet, Coréia e Vietnã).

THERAVADA — o CAMINHO DA AUTO-REDENÇÃO

Como sugere o nome Theravada ("a escola dos antigos"), essa escola acredita representar o budismo em sua forma original. De acordo com os ensinamentos do Buda, enfatiza a salvação individual por meio da meditação. Como não existe nenhum deus para redimir o homem do ciclo dos renascimentos, ela ressalta que o indivíduo deve salvar a si mesmo. Assim, podemos dizer que o budismo Theravada é uma religião de auto-redenção.
Aqui, o Buda é visto como mestre e guia dos seres humanos. Ele não é adorado como um deus, nem pode salvar as pessoas, mas indicou o caminho para a salvação, que pode ser seguido pelo indivíduo.

Na prática, só os monges podem imitar o exemplo do Buda até atingir o nirvana, e mesmo entre eles, muito poucos o alcançam nesta vida. Um monge que pertença a esse pequeno grupo é chamado arhat (venerável). O arhat, como o Buda, já extinguiu seus desejos e venceu o mundo. É um exemplo resplandecente para os leigos e o ideal que todos os budistas perseguem, pois mesmo que um budista não consiga deixar este mundo definitivamente em sua vida atual, ele pode conseguir um bom carma para si mesmo e talvez se tornar um monge numa existência futura.

Podemos dizer que a idéia mais importante do budismo Theravada é que o próprio indivíduo deve assumir responsabilidade por seu desenvolvimento ético e religioso. Não há atalho para a salvação nem para a perfeição ética. Cada pessoa deve começar por si mesma. Isso se aplica aos leigos, bem como aos monges.

MAHAYANA — O CAMINHO DA AJUDA MÚTUA

Até agora, baseamos na escola Theravada a representação da vida e dos ensinamentos do Buda, assim como a descrição da vida religiosa budista. A seguir vamos nos afastar dessa abordagem do "budismo comum" e nos concentrar nas características do budismo Mahayana.

Mahayana significa "o grande veículo", ou "a grande nave", e seu nome reflete a crença, predominante no budismo do Norte da Ásia, de que é possível levar todas as pessoas à redenção. O budismo Theravada é chamado de Hinayana, ou seja, "o pequeno veículo", já que leva apenas alguns (os monges) a salvação.

Também na visão que têm de Buda, existem grandes diferenças entre o budismo Mahayana e o budismo Theravada. Enquanto o Theravada considera o Buda apenas um ideal e um raio de salvação, o Mahayana acredita no Buda como o salvador, isso é importante porque implica que os monges não são os únicos que podem ser salvos. Os leigos podem igualmente se devotar ao Buda e, por sua graça, alcançar a redenção.

OS BODHISATTVAS

O objetivo do budismo inicial era que o indivíduo atingisse a salvação por seus próprios esforços. O ideal do indivíduo consistia em se tornar um arhat, ou seja, alguém que deixou o mundo para trás e entrou no nirvana. Esse objetivo, porém, era muito estreito para o Mahayana. Interessar-se apenas pela própria salvação é considerado egoísmo. O objetivo deve ser a redenção de todos. Em conseqüência, o ideal religioso do budismo Mahayana é o bodhisattva, o qual, depois de alcançar a iluminação (bodhi), abdica do nirvana a fim de ajudar outras pessoas a alcançar a salvação. Aqui muitas vezes se ressalta que o próprio Buda abdicou do nirvana imediato por causa da compaixão por seus semelhantes.
Um bodhisattva ("existência iluminada") pode ser qualquer pessoa que resista a se tornar um Buda. No entanto, esse termo se aplica sobretudo a uma longa lista de etéreas figuras de salvador, às quais os seres humanos podem recorrer em busca de ajuda. A única coisa que as distingue de um Buda é que elas não entram no nirvana até que todas as criaturas vivas tenham sido redimidas do renascimento.

Características típicas de um bodhisattva são a compreensão e a compaixão. Hoje em dia é a compaixão do bodhisattva que é mais realçada. A bondade para com as outras criaturas vivas não é considerada simplesmente um ideal, mas o caminho para a iluminação e a redenção.

Com sua doutrina do bodhisattva, o budismo Mahayana se afastou muito dos ensinamentos do budismo Theravada. Assim como o cristão "põe sua vida nas mãos de Deus", o muçulmano "se submete" a Alá e os vaishnavitas"se dedicam" a Vishnu — o budista mahayana pode compartilhar do amor salvador de um divino bodhisattva.

A DOUTRINA DO CARMA E A ILUSÃO DO EU

Como já vimos, o budismo Mahayana discorda do Theravada na doutrina de que o homem deve salvar a si mesmo. Isso também implica um rompimento com a doutrina estrita do carma. A idéia de que uma pessoa pode ser salva de seu carma pelos méritos alheios é impensável no budismo do Sul. Porém, o Mahayana tem um conceito próprio de carma: uma vez que há uma relação de dependência recíproca entre todos os seres vivos, não é o carma do indivíduo que é importante.

Nesse ponto, muitos budistas mahayana se referem ao fato de que a experiência do eu, de ser algo separado do mundo ao redor, é simplesmente resultado da cegueira do homem. E apenas os que fizeram pouco progresso rumo à  iluminação é que sofrem dessa cegueira. O bodhisattva, por outro lado, já superou a ilusão do eu e não distingue mais entre si mesmo e os outros. Assim, um bodhisattva pode transferir algo de seu bom carma para os que procuram a ajuda dele na luta para atingir o nirvana.

Diversidade religiosa

O hinduísmo e o budismo sempre demonstraram um nível de abertura e tolerância em questões religiosas bem diferente daquele a que estamos acostumados no Ocidente. A diversidade religiosa não é considerada uma fraqueza. Muitos budistas diriam até que o oposto é que é verdade. A força do budismo se revela nos numerosos frutos que ele traz.
O objetivo de todos os budistas é se redimir do ciclo dos renascimentos. A questão consiste em saber que métodos ou recursos devem ser procurados para se atingir esse objetivo. As pessoas são muito diferentes. Os povos asiáticos, em particular, são provenientes de formações culturais bastante variadas. Assim, os métodos utilizados precisam refletir esse fato. Em conseqüência, costuma-se destacar que a experiência é o princípio que deve guiar a escolha dos métodos.

Entre os muitos movimentos dentro do Mahayana, dois atraíram mais interesse nas últimas décadas. São a tendência tibetana Vajra-yana (o veículo de diamante) e o zen-budismo japonês.

Esses movimentos se destacam do budismo Mahayana de várias maneiras.

BUDISMO TIBETANO

No Tibet, o budismo se incorporou à religião local, denominada Bon. Esta se caracterizava pela crença em deuses e espíritos, que eram cultuados com sacrifícios sangrentos, encenações de mistérios e danças rituais. Vários desses deuses originais continuam sendo cultuados como guardiães dos ensinamentos budistas. Contudo, sob a superfície prevalece a doutrina budista. Os budistas tibetanos acreditam que eles representam a doutrina original, não adulterada.

Algumas características externas mais aparentes do budismo tibetano são as rodas de oração e as bandeiras de oração — objetos que contêm diversas orações e fórmulas escritas. Quando a roda de oração gira — impulsionada ou pela mão de alguém ou pelo vento ou pela correnteza de uma cachoeira — ou a bandeira tremula ao vento, ela põe em movimento "a roda do ensinamento".

O mantra (fórmula mágica ou enunciação sagrada) mais comum no budismo tibetano é Om Manipadme Hum, que significa "O tu, que tens a jóia no teu lótus", ou "Seja louvada a jóia no lótus".

Essa fórmula é encontrada por toda parte no Tibet: nas rodas de oração, nas paredes, nas rochas e, naturalmente, nos lábios das pessoas. Para aumentar sua eficiência, usa-se um rosário de 108 contas (108 é um número sagrado).

O LAMAÍSMO

No Tibet o budismo muitas vezes é chamado  lamaísmo,  do termo lama ("professor" ou "mestre"), nome dado aos líderes espirituais, em geral monges.

Em nenhum outro país do mundo o budismo permeia tão completamente o tecido da sociedade como no Tibet. Grandes parcelas da população se integraram às ordens religiosas de monges e monjas, e os mosteiros sempre tiveram íntimo contato com os leigos. Vários desses mosteiros já abrigaram mais de mil monges e são considerados as maiores instituições monásticas que já existiram.

A originalidade do lamaísmo reside em sua estrutura social.

Desde o século XVII o Tibet é governado por um lama principal, ou dalai-lama (oceano de sabedoria), que tem sua sede na capital, Lhassa. O dalai-lama é o líder religioso e político do país. Acredita-se que ele seja a reencarnação de um famoso bodhisattva.

Ao morrer um dalai-lama, os sacerdotes buscam uma criança que tenha sua marca. Quando, depois de vários testes, é encontrada a criança certa, ela é consagrada como o novo dalai-lama.

BUDISMO TIBETANO CONTEMPORÂNEO

Em virtude de sua cultura muito distinta e de sua localização inacessível entre as montanhas mais altas do mundo, o Tibet por um longo tempo foi considerado uma espécie de "terra de contos de fada". Porém, em 1959 o conto de fada teve um fim súbito: a China assumiu o controle total do país e o dalai-lama foi obrigado a fugir para a Índia, onde obteve asilo político. Desde essa época, dezenas de milhares de tibetanos se refugiaram na Índia e no Nepal, lugares em que o budismo tibetano continua vivo.
Mosteiros budistas seguindo os padrões tibetanos surgiram na maioria dos países da Europa Ocidental e nas Américas.

Zen-budismo

A maior ambição de todos os budistas é atingir algum dia a iluminação (bodhi), como aconteceu com o Buda debaixo de sua figueira em Bodh Gaya, há 2500 anos. Dentro do budismo, porém, existem consideráveis diferenças de opinião sobre o que essa iluminação implica e como se chega a ela. Dentro da tradição do budismo Mahayana, surgiu na China uma escola especial de meditação que, mais do que qualquer outro movimento, realçava a iluminação como o verdadeiro núcleo do budismo. Esse movimento aos poucos se espalhou para a Coréia e o Japão, e ficou conhecido no Ocidente por seu nome japonês, Zen, que significa "meditação". Como hoje em dia é mais fácil estudar o zen no Japão do que na China, vamos nos concentrar no zen-budismo japonês. No Japão essa vertente budista conta hoje com cerca de 20 mil templos e 5 milhões de adeptos, entre monges e leigos.

"VISÃO DIRETA"

O zen-budismo se baseia na iluminação do Buda. Os ensinamentos do Buda, tal como foram passados para os textos budistas, não recebem tanta prioridade. Isso reflete a profunda desconfiança do zen quanto à palavra e sua capacidade de transmitir conhecimento. Não obstante, aquilo que não pode ser transmitido pela palavra pode ser transmitido pela "visão direta". Diz-se que o Buda trouxe a iluminação para seu discípulo mais promissor simplesmente segurando uma flor diante dele, sem nada dizer. Assim, a iluminação vem sendo comunicada de geração em geração pela transmissão não verbal.
Ensina o zen que a iluminação deve vir de dentro, deve ter sua origem no coração do indivíduo. Conta-se que um famoso mestre zen jogou todas as imagens do Buda na lareira a fim de aquecer a sala em que ele e seus discípulos se encontravam.

Os ensinamentos do Buda só podem nos levar até uma parte do caminho. Podem ensinar o rumo certo, mas o importante é vislumbrar aquilo para onde apontam, a iluminação em si. Nós, seres humanos, muitas vezes nos comportamos como crianças; estamos mais interessados no dedo que aponta do que naquilo que ele mostra.

É fácil manifestar mais preocupação com as idéias ou os rituais religiosos do que com a experiência religiosa que é objeto dessas idéias e desses rituais. Aqui o método de "apontar diretamente" pode ajudar a obter uma compreensão espontânea da realidade, uma percepção sem restrições, que não precisa de palavras.

Uma vez que a iluminação deve vir de dentro, o zen-budismo não tem nenhuma fórmula fixa para alcançá-la. Mas ela pode chegar quando menos se espera e atingir a pessoa como um raio. É como uma piada que de repente se compreende. De súbito, a pessoa "desperta" — e fica consciente de que faz parte do infinito, de uma maneira inteiramente nova. Isso não vem gradualmente, com o tempo. Quando ela chega de fato, é total. Sua manifestação não está ligada nem mesmo à meditação. Uma experiência mundana qualquer também pode acabar levando, com igual facilidade, ao objetivo desejado.

A "TERAPIA DE CHOQUE" ZEN-BUDISTA

Alguém já disse que o budismo Theravada busca abrir a porta do nirvana à força, ao passo que o Mahayana quer ficar mexendo a chave até que a porta se abra por vontade própria. Essa descrição talvez seja mais típica do zen-budismo que de outros movimentos mahayanas.

Como vimos, as noções fixas podem ser um obstáculo para a iluminação; portanto, um pré-requisito é a mente se esvaziar de palavras e idéias. O importante no zen é romper com a lógica do discípulo e com seus processos conceituais de pensamento. Desde a era chinesa do zen, a mais antiga, isso sempre foi feito pelos mestres ao apresentar a seus discípulos perguntas e respostas totalmente surpreendentes. A seguinte conversa entre mestre e discípulo serve de exemplo dessa técnica:

DISCÍPULO: Qual é o caminho para a libertação?
MESTRE: Quem está te acorrentando?
DISCÍPULO: Ninguém está me acorrentando.
MESTRE: Então, por que queres ser libertado?

Semelhante a esses diálogos é o uso de charadas que parecem absurdas e sem sentido. O mestre zen pode fazer a seu discípulo perguntas como: "Como era seu rosto antes de você nascer?". Ou: "Que som se produz quando se bate palma com uma só mão?". Ao ponderar esses enigmas,o discípulo zen é levado a experimentar um "sentimento de dúvida"

O ZEN NA VIDA COTIDIANA

Uma característica do zen é sua atitude positiva para com as tarefas mundanas. Isso deriva  da visão zen sobre o que é a iluminação. Se se pedisse a um zen-budista que explicasse a iluminação, ele poderia talvez dizer: "O cipreste no jardim!". Ou, se ele realmente estivesse disposto a responder à pergunta em nossos termos, poderia dizer que a iluminação é perceber que não existe iluminação. Como não há nenhuma "verdade" para a qual se deva acordar, e nenhuma "ilusão" da qual se deva acordar, a iluminação é compreender que o mundo é tal qual nós o vemos.

Mas nós estamos agora empregando palavras e conceitos, e assim fazendo, estamos nos distanciando dos ensinamentos do Buda. Talvez devêssemos dizer que não há nenhuma outra maneira de compreender o significado da vida a não ser vivê-la. Em conseqüência, muitos zen-budistas destacam que o trabalho rotineiro pode ser usado como um exercício de meditação. A prática consciente de uma rotina manual pode ser tão favorável para a iluminação quanto a meditação e os rituais religiosos. Por esse motivo, ocupações aparentemente triviais como tomar chá, fazer arranjos de flores e cuidar do jardim passaram a ter grande importância no zen-budismo.

No Japão, certos esportes e formas de arte também receberam forte influência do zen: arco e flecha, luta corporal, esgrima, teatro, poesia (haicai), música e pintura.

O reavivamento budista

Em épocas recentes, e em especial desde a última guerra mundial, o budismo passou por um reavivamento, sobretudo entre os budistas com mais treino filosófico. Aspectos importantes desse reavivamento são o trabalho pela unidade do budismo, maior empenho missionário e maior atividade social.

MAIOR UNIDADE

Diversos concílios mundiais budistas tentaram iniciar uma cooperação budista internacional. Isso inclui um esforço para se obter maior unanimidade de doutrina entre as várias seitas budistas. Os concílios passam a desempenhar, assim, um papel semelhante ao do Conselho Mundial de Igrejas dentro da religião cristã.

MISSÃO

Outro aspecto desse reavivamento budista é a atividade missionária, que começou também no Ocidente. Hoje há milhares de budistas nas Américas e na Europa Ocidental, e várias capitais têm centros missionários. Por outro lado, o budismo perdeu terreno em países da Ásia depois da Segunda Guerra Mundial, sobretudo em razão da ascensão do comunismo.

ATIVIDADE SOCIAL


Houve ainda uma grande mudança no terreno ético. O ideal budista original era trabalhar por sua própria salvação se valendo da meditação, algo que pouco incentiva a atividade social. Mas o budismo também realça a abnegação de si e a caridade, o que tem levado a uma participação ativa nas questões sociais e políticas contemporâneas.

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